O jiu-jitsu vem crescendo muito entre as mulheres nos últimos anos, isso é claramente visível. Porém, a diferença ainda é grande. Conheço meninas que ainda são as únicas em suas academias, o que era comum há algum tempo, quando as pioneiras começaram a treinar, por exemplo. Mas algo que também notamos bastante diferença é nas competições. Categorias de faixa preta masculino lotadas, enquanto o feminino às vezes nem tem todas os pesos completos. No Rio Open que aconteceu nos últimos dias 7 e 8 de abril tinham apenas seis meninas na faixa marrom, contando todas as categorias de peso.
Então, sempre nos questionamos: qual o motivo dessa disparidade? É certo que a evolução do jiu-jitsu feminino foi tardia em relação ao masculino. Portanto, tudo para nós foi um pouco depois. As primeiras faixas pretas, primeiras mulheres a competir, primeiras campeãs mundiais, primeiro campeonato a ter todas as faixas em categorias separadas. Isso influencia sim a prática das mulheres hoje. Pois demorou mais para começarmos a desbravar o universo do jiu-jitsu, então o estímulo que temos para disputar campeonatos e/ou nos tornarmos atletas profissionais vem mais devagar e ainda é menor. A isso se soma não somente o caso do jiu-jitsu, mas toda a relação da mulher no esporte, que sempre foi cercada de machismo e proibições. Inclusive por meio do Decreto-Lei 3.199 de 1941, que no art. 54. diz: “às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompativeis com as condições de sua natureza, devendo, para este efeito, o Conselho Nacional de Desportos baixar as necessárias instruções às entidades desportivas do país”.
Só que não é apenas isso. São vários os fatores que afastam as mulheres das competições. Nós do BGM realizamos um questionário online para entender alguns desses motivos. Porém, antes dessa análise, vale ressaltar que precisamos também fazer a nossa parte. Botar a cara para lutar, se mostrar presente, buscar o nosso espaço. Afinal, fazendo isso, estamos ajudando todas as mulheres do jiu-jitsu. Pois quanto mais meninas competindo, mais vão se encorajar a treinar e, quem sabe, lutar também. Afinal, é muito legal quando temos meninas compartilhando as mesmas experiências conosco nos treinos e quando vemos as categorias femininas cheias e pegando fogo.
Então, vamos ao questionário. Foram 132 respostas e as perguntas foram as seguintes: (1) Há quanto tempo treina jiu-jitsu? (2) Qual a sua graduação? (3) Costuma participar de competições? (4) Que motivo te leva a não competir e/ou dificulta que participe com mais frequência? (5) Em relação a patrocínio, algumas atletas falam que o que se exige de um homem e de uma mulher é diferente, como a aparência, por exemplo. Você concorda? / Por que? (6) Espaço opcional para adicionar comentários.
A maioria das mulheres que responderam estão na faixa azul (45%), branca (26%) e roxa (18%). Seguidas das faixas marrons, pretas e coloridas (do juvenil). Em relação a tempo de treino, tivemos de tudo. Menos de um ano treinando, cinco anos, mais de dez; foi bem diversificado. A maioria delas disse que disputam campeonatos, sendo 66,7% contra 33,3% que não tem esse costume.
Um motivo em especial para não competir foi escolhido (dentre outros também) por mais da metade das participantes: 53% não lutam por falta de patrocínio ou apoio financeiro. Logo depois vieram dois outros fatores, ambos com aproximadamente 36%: preço das inscrições (de algum modo se relaciona ao primeiro) e fatores externos, como estudo, trabalho, filhos. Em seguida, na ordem, tivemos: medo/falta de confiança (27%), diferença de premiação entre masculino e feminino (14%), falta de incentivo/estímulo (14%), desmotivação (10%) e falta de representatividade (4%).
Além dos fatores que sugerimos, abrimos um espaço para “outros” e tivemos comentários como: lesões, ansiedade, falta de outras competidoras, distância (poucos campeonatos no interior), brigas em casa, subestimação por parte de outras pessoas. Enfim, são vários os motivos que levam as mulheres a não competir. Mas como foi falado antes, é uma via de mão dupla.
A Mayara Munhos fez um texto falando sobre o ponto do vista de atletas e de organizadores dos eventos. Realmente, as mulheres ainda são minoria nos campeonatos, apesar de se esforçarem igualmente aos homens para chegar até lá. Mas, um exemplo, um absoluto faixa roxa masculino com 30 atletas e o feminino com 5. Pelo que todos pagaram pela inscrição, como garantir premiações iguais? É o questionamento dos organizadores. Sim, temos MUITAS mulheres treinando hoje, mas em algumas competições a gente fala “cadê?”. Minha intenção não é apontar o dedo para as mulheres, mas é preciso saber que a gente tem que fazer a nossa parte, se queremos exigir algo.
Mas, o intuito do questionário foi descobrir o motivo disso e fazer o texto para que as meninas se vejam nessas diversas situações e possam se encorajar a lutar. Lógico, ninguém é obrigado, mas é uma parte muito importante da nossa evolução no jiu-jitsu. Sabemos também que, como mostraram as respostas, muitas mulheres querem competir, mas por diversos fatores, não conseguem.
Temos que travar uma luta dentro e fora dos tatames para que o jiu-jitsu feminino continue crescendo. A mulher ainda precisa enfrentar uma dupla jornada de trabalho (fora e em casa), ainda é vista como responsável por cuidar dos filhos e afazeres domésticos, é cobrada em relação à aparência, é vista diante de padrões impostos socialmente. Esses fatores e o machismo foram destacados por algumas meninas nos comentários adicionais.
Hoje, o jiu-jitsu se profissionaliza a um nível rápido, em termos de atletas lutando. Já na faixa azul/roxa vemos meninas que vivem do jiu-jitsu, ou conseguem se dedicar à carreira de atleta. E isso é MARAVILHOSO! Mas, às vezes, acaba intimidando as demais praticantes a competir. Eu mesma, não vivo do jiu-jitsu e não sou competidora nata. Mas amo lutar. Já perdi muitas vezes, ganhei algumas, mas a cada competição é um aprendizado, uma evolução. Por isso, se é a vontade de vocês, não deixem de lutar. Afinal, quanto mais mulheres nos campeonatos, sejam elas atletas profissionais ou não, mais o nosso esporte cresce e mais meninas vão se inspirar a começar.
Você é forte, é capaz, é boa, não deixe ninguém te convencer do contrário. Por mais que você não saia com a medalha de ouro, não pode desistir dessa caminhada. Estamos aqui para lutar juntas! E vamos lotar essas competições! Oss