Essa semana um caso de abuso infantil repercutiu absurdamente dentro do cenário do jiu-jitsu. Um atleta amazonense, atualmente com 23 anos, usou as redes sociais nesta segunda-feira para expor os abusos que sofreu entre os 10 e 14 anos, por seu professor de jiu-jitsu Alcenor Alves Soeiro, de 56 anos.
O bandido (sim, BAN-DI-DO, não “suspeito”) foi preso no sábado, acusado de estuprar e abusar sexualmente de seus alunos.
A vítima compartilhou que o professor dava remédios para fazer as crianças dormirem e então cometia os abusos durante as viagens do grupo.
Estuprador foi detido em um campeonato de jiu-jitsu em Balneário Camboriú enquanto participava do evento com crianças e adolescentes
De acordo com a polícia, 12 vítimas já foram identificadas, e outras seis estão esperando para prestar depoimento. De acordo com as investigações, os crimes ocorreram entre 2011 e 2018.
O que chama a atenção nesse caso – além dos crimes em si – foi o fato de que 3 depoimentos iniciais foram suficientes para trazer à luz diversos outros, inclusive de atletas hoje renomados dentro do esporte como Matheus Gabriel, Ary Farias, Meyram Maquiné e Thalison Vitorino, que também expuseram os abusos cometidos pelo professor enquanto os mesmos eram crianças.
Uma das vítimas, hoje um atleta de 23 anos, decidiu compartilhar os traumas que sofreu durante a infância:
“Todas as vezes que eu viajava para competir com ele e outras crianças ele sempre dava banho em todos nós e no final da noite mandava a gente tomar melatonina para dormir bem e, no outro dia, acordávamos com o pênis dolorido, sem saber o que tinha acontecido”, contou o lutador em uma sequências de stories em seu perfil no Instagram.
“Eu e outros amiguinhos apenas tínhamos um sonho de ser campeões mundiais, mas todos nós erámos manipulados e tínhamos que lidar com isso”.
De acordo com o relato, o professor o masturbava, o beijava e praticava sexo oral nele:
“Eu tinha apenas 10 anos e não sabia o que estava acontecendo. Eu me tremia de nervoso e no final do dia chorava perguntando porque aquilo aconteceu comigo”.
“Ele sempre fez isso com crianças que não tinham uma boa condição. Ele procurava sempre me manipular e falava que me tinha como um filho, me prometia muitas coisas, mas eu era somente mais uma criança que estava sendo abusada em sigilo”.
Mas porquê a “demora” em denunciar?
A delegada Deborah Ponce de Leão explicou que a atitude de ocultar o ocorrido é comum entre as vítimas. O abuso causava vergonha de contar o que estava acontecendo para os pais.
“Esses garotos, no primeiro momento, tinham um encantamento pelo autor, uma vez que ele é um professor renomado de jiu-jítsu, mas só depois de um tempo eles perceberam o que realmente estava acontecendo. As vítimas, inclusive, tinham vergonha de contar para os seus pais e esse foi um ponto que precisou ser alcançado pela equipe multidisciplinar”.
“As investigações apontam que ele teria abusado de meninos que são campeões mundiais de jiu-jítsu e os teria explorado sexualmente, oferecendo presentes e favores, comprando kimono, mediando passagens e estadias para disputa de campeonatos”.
De acordo com Deborah, os abusos sexuais eram praticados durante as estadias e na casa do professor, onde ele as dopava para cometer os abusos. Em algumas das situações, ele chegava a dar banho nas vítimas, que já eram adolescentes, e aproveitava a ocasião para tocar em suas partes íntimas.
“Um dos atletas começou a ser abusado sexualmente em meados de 2018, quando tinha 9 anos. Essa vítima, inclusive, foi constatado o coito anal. Diante de todos esses relatos, nós angariamos o indício da autoria, a materialidade, e representamos pela prisão temporária dele”, disse Deborah na coletiva de imprensa.
A equipe de investigação também teve acesso a mídias pornográficas envolvendo possíveis vítimas, mas os materiais estão em sigilo. Outra informação sobre o caso é de que o estuprador pretendia fugir para Dubai.
“Ele chegou a coagir algumas vítimas, às procurando para pedir perdão, e a uma delas, inclusive, o autor chegou a oferecer que ela fosse em seu lugar para a viagem para Dubai. O professor ainda entrou em contato com a mãe dessa vítima, como uma espécie de coação para que a situação fosse abafada”, contou a delegada.
O caso, infelizmente, não é isolado
Em 2017, foi noticiado que um instrutor de jiu-jitsu estava sendo investigado pelos crimes de pedofilia, abuso sexual infantil e por molestar alguns de seus alunos, na cidade de Winnipeg, no Canadá.
Manuel Vladmir Ruiz, na época com 52 anos, foi preso e a investigação mostrou que os crimes teriam começado em 2001, quando Ruiz tinha 36 anos.
As informações, divulgadas pelo canal CBC, mostraram que era na academia de artes marciais que os abusos sexuais aconteciam.
O professor foi “identificado depois que três vítimas prestaram depoimentos e revelaram a identidade de seu agressor”, conforme informação que o Departamento de Polícia de Winnipeg publicou em seu site.
Outro caso, pouco noticiado também, ocorreu em 2022 quando a Polícia Civil do Estado do Pará prendeu o instrutor de artes marciais Aedson Lira Pimentel, que foi acusado de ter praticado o crime de estupro de vulnerável contra uma de suas alunas, com 10 anos de idade na época.
O crime repercutiu muito na cidade de Redenção, já que o acusado chegou a ser preso e ganhou a liberdade dias após a prisão demonstrando a piada que é nosso sistema judiciário. O estuprador chegou a ser preso novamente depois disso.
Conduta inaceitável de professores comumente é vista como “uma falha”, inclusive por nomes conhecidos dentro do esporte
Em 2018, o caso de um professor brasileiro de jiu-jitsu que foi preso em uma academia em Naples, na Florida, chamou a atenção.
Ele foi acusado nada menos que TRÊS vezes de agressão sexual contra uma garota de 16 anos que era sua aluna.
Mas o que mais chamou a atenção no caso foi o posicionamento de uma figura conhecida no esporte, Roberto Abreu, o Cyborg.
Ele era o professor e amigo íntimo do homem acusado e ao invés de usar sua influência para expor e denunciar a má conduta sexual do amigo, a utilizou para minimizar o ocorrido e não ofereceu apoio adequado à vítima.
Cyborg, além de ter feito pouco caso da situação, ainda apoiou o acusado, Marcel Gonçalves, e inclusive o recebeu em uma academia da Fight Sports depois que ele foi detido.
Algumas vítimas e testemunhas descreveram ao renomado jornal “The New York Times”, que Cyborg refutou a denúncia de tentativa de agressão sexual e ignorou a situação, fato que ele negou ao dizer que nunca desdenhou das preocupações das vítimas e nem tentou intimidar ninguém.
Com a repercussão do caso e a visibilidade negativa, Cyborg reconheceu alguns erros em uma postagem em seu Instagram: “Para as vítimas e suas famílias, lamento pelo meu tratamento inadequado, pela falta de preparação e pela falta de liderança adequada para lidar com a experiência horrível pela qual passaram”.
Caso do professor preso por abusar sexualmente de meninos gera comoção e motiva decisão da IBJJF e Federação de Jiu Jitsu do Amazonas
Nesta semana, a FJJAM anunciou o banimento e cassação da faixa preta de jiu jitsu de Alcenor Alves. Logo após, tanto a CBJJ quanto a IBJJF anunciaram por meio de um comunicado nas redes sociais, o banimento de Alcenor Alves, dessa forma ele está proibido de participar de eventos e atividades promovidas por ambas as federações:
“A Confederação Brasileira de Jiu-Jitsu (CBJJ) e a International Brazilian Jiu-Jitsu Federation (IBJJF) manifestam profunda indignação diante dos atos de violência sexual atribuídos ao professor de Jiu-Jitsu Alcenor Alves Soeiro contra menores de idade, conforme amplamente divulgado pela imprensa. Tais crimes são inaceitáveis e violam os princípios éticos mais basilares do esporte.
A CBJJ e a IBJJF informam que Alcenor Alves Soeiro será banido definitivamente de seus quadros e não poderá mais participar de eventos e atividades promovidas pela entidade. A CBJJ e a IBJJF repudiam comportamentos que violem a integridade e a segurança de praticantes do esporte, especialmente quando as vítimas são crianças e adolescentes.
Enaltecemos os atletas que tiveram a coragem de expor as situações de violência sofridas, permitindo que outras vítimas se sintam encorajadas a denunciar seus algozes. A CBJJ e a IBJJF esclarecem que todos os casos de abuso serão tratados com rigor e reafirma o compromisso de garantir ambientes seguros, éticos e respeitosos em todas suas atividades”.
Apesar de acharmos profundamente correto o posicionamento das federações a respeito do ocorrido, o grande questionamento que fica sobre isso é: Por que “só” neste caso?
Há décadas, mulheres constantemente são abusadas e desrespeitadas por professores de jiu-jitsu mundo afora, e frequentemente ignoradas pelas federações, que não se posicionam banindo os abusadores.
Um caso recente disso é o do Erberth Santos, que foi condenado a mais de 14 anos de prisão em regime fechado por cometer os crimes de roubo e ESTUPRO.
Alguém por aí leu algum posicionamento das federações a respeito de um banimento desse bandido? Não. Porque esse posicionamento não existiu.
Outro caso, que embora não tenha relação com abuso mas também chamou atenção pela omissão da federação, foi a final do absoluto feminino faixa preta do ano passado, no qual a atleta Ana Carolina Vieira foi finalizada e os sinais feitos por ela para parar a luta não foram vistos pelo árbitro, que só encerrou a luta após a atleta estar desacordada há 16 segundos.
A falta de posicionamento da federação chamou a atenção pelo fato de que a atleta, 5 vezes campeã mundial e tão presente nos eventos promovidos pela mesma, recebeu tão pouca atenção.
A questão que fica é: até que ponto existe uma real preocupação por parte da CBJJ e da IBJJF em promover uma cultura saudável dentro do esporte?
Isso, sem contar inúmeros outros casos, como o caso de Herman Gutierrez, que respondeu processo de suposta agressão contra Ericka Almeida e o caso saiu inclusive no G1, e ele continua não só livre, como dando aula normalmente. Poderíamos ficar falando de casos e mais casos aqui, que passaram despercebidos.
Entendemos que se trata de um caso que teve uma maior repercussão e diante da gravidade, afinal, foram 4 multi campeões abusados na infância por um professor de jiu-jitsu. Mas afinal, porque em tantos e tantos outros casos não houve banimento ou pronunciamento?
Ou, até que ponto tudo se resume a interesses comerciais, visto que, casos envolvendo pedofilia poderiam manchar a imagem das federações de forma definitiva? Fica a dúvida.
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