Fala, galera! Ultimamente venho comparecendo um pouco mais aos eventos grandes aqui em São Paulo para fazer algumas fotos das lutas femininas. Cobri o Brasileiro, a segunda Etapa do Paulista, SP BJJ Pro, entre outros, e entre uma luta e outra, uma coisa que me chamou muito a atenção nesses eventos foi a postura de boa parte dos atletas e professores para com os árbitros.
Muitos xingamentos, pedidos de pontos, vantagens (?) e até eu que entendo ~pouco~ de regra, via que muitas vezes, o árbitro não tinha que dar ponto ou vantagem em determinadas situações. Pensando nisso, decidimos conversar com alguns deles para saber como é realmente a função do árbitro. Conversamos com o Francisco Pitta Jr (que trabalha na coordenação de campeonatos há muitos anos), com o Gabriel Rocha, que é árbitro da FPJJ e CBJJ há cerca de 10 anos, com a Talita Treta (que é atleta e também arbitra em alguns eventos) e com o Fabio Medeiros, que é árbitro da IBJJF há 7 anos.
Pitta trabalha há mais de 15 anos como colaborador da FPJJ, é professor da Ryan Gracie Ipiranga e participa de vários eventos onde trabalha como coordenador. Por sua experiência de muitos anos arbitrando e coordenando, hoje ele foi convidado para falar um pouco sobre arbitragem aqui na BGM.
BGM: Qual foi a maior dificuldade que já enfrentou na profissão?
Pitta: A maior dificuldade na função de árbitro acredito que seja a falta de conhecimento das regras por parte de alguns professores e atletas, que às vezes ficam tumultuando sem conhecimento delas.
BGM: Qual foi a luta mais difícil que você fez?
Pitta: A luta mais tensa que arbitrei foi entre o Jorge Patino Macaco x Marcel Louzada, uma luta de empurra empurra, sem espaço, sem detalhes para decidir aqui ou ali e no final um pouco mais de ação do Macaco fez a diferença.
BGM: Você acha que hoje muita gente fala sobre as regras, sem realmente entendê-las? Qual a sua opinião sobre?
Pitta: Árbitro é um ser humano como qualquer outro podendo errar, lógico que a sequência de erro tem que ser avaliada, mas algumas pessoas reclamam sem base nenhuma, reclamam pelo simples fato de reclamar para ver ser conseguem alguma vantagem.
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Fizemos também esse bate-papo com o Gabriel, que começou a treinar jiu jitsu em 2000, e começou a arbitrar no final de 2006, ainda com a faixa marrom. No ano seguinte, fez o curso da FPJJ e passou com qualificação para árbitro, então estagiou e depois se tornou árbitro, oficialmente.
De lá pra cá, são 10 anos de arbitragem, já trabalhou nos melhores eventos do Jiu-Jitsu, na FPJJ, CBJJ, IBJJF e UEAJJ (Abu Dhabi), como Paulista, Brasileiro, Panamericano, Mundial e Mundial Profissional, entre tantos outros. Gabriel é professor da Cia Paulista de Jiu Jitsu, nas filiais de Moema e da Vila Olímpia.
BGM: Qual foi a maior dificuldade que já enfrentou na profissão?
Gabriel: No início, quando a torcida e os professores não conhecem o seu trabalho, você ainda é um novato, todos tentam te pressionar e às vezes até te ofendem. Mas temos que ter convicção nas nossas decisões, porque elas podem mudar o resultado de uma luta inteira. O segredo é treinar e estudar muito a regra, assistir muitas lutas e se atualizar sempre.
BGM: Qual foi a luta mais difícil que você fez?
Gabriel: Não existe a luta mais difícil, são muitas lutas polêmicas, todas as lutas são importantes, temos que ter atenção em todas, do faixa branca ao preta.
BGM: Você acha que hoje muita gente fala sobre as regras, sem realmente entendê-las? Qual a sua opinião sobre?
Gabriel: Sim, muita gente ainda luta e compete sem saber a regra. Hoje a regra está disponível para qualquer um, basta acessar o site da confederação e fazer o download. Todos podem ter acesso! Porém ainda temos muitos atletas e professores que não dão o devido valor, eles acreditam que por serem competidores já sabem a regra. Mas isso já melhorou muito, atualmente algumas equipes tem cada vez mais se informado e se atualizado com as regras.
BGM: Quais as dicas que você dá para quem deseja se tornar um árbitro no futuro?
Gabriel: É preciso estudar a regra, fazer os cursos das federações e da confederação, e treinar muito, o Jiu-Jitsu está em constante evolução. Cada hora surge posições novas e precisamos conhecer para saber se aquilo é válido e se vale pontuação. Estude muito, treine muito, assista muitas lutas, aprenda a analisar as posições e de onde elas começaram, como se desenrolou. Para ser um bom árbitro, você deve ser um estudioso do Jiu-Jitsu.
Fora o Gabriel, também conversamos com o Fabio, que é faixa preta da Gracie Morumbi, e que inclusive acabou de voltar de uns dias cheios de trabalho no Mundial de Masters da IBJJF, que rolou na última semana em Las Vegas. Fabio tem 7 anos de experiência como árbitro internacional, e contou pra gente o seguinte:
BGM: Qual foi a maior dificuldade que já enfrentou na profissão?
Fabio: A maior dificuldade que eu enfrentei e continuo enfrentando é tentar não levar pro lado pessoal, é muito chato quando você sai de casa, pega avião, faz curso, arbitra o dia inteiro e depois escuta ou lê em algum lugar algum professor “dono da verdade absoluta” dizer que você agiu de má fé. Não leva em consideração a luta, se o atleta realmente perdeu ou não. Vai sempre criticar o árbitro. Infelizmente depois de muitos anos ainda existem atletas que não perdem luta. Ou foi roubado ou foi falta de experiência do árbitro.
BGM: Qual foi a luta mais difícil que você fez?
Fabio: Acho que todo final de semana tem uma luta mais difícil do que a outra. Para dar exemplos uma delas foi num evento no interior de MG onde tive o prazer de arbitrar uma luta de dois meninos super especiais, uma luta casada entre portadores da síndrome de down. Nunca entrei pra uma luta tão pressionado como essa. (Você pode ver o vídeo dessa luta AQUI). E tem também uma final do Leandro Lo contra o Keenan no NY BJJ PRO onde saia calça voltava posição, lapela enrolada, faixa caía. E foi decidida praticamente nos 7 segundos finais. (Para ver o vídeo da luta, acesse AQUI).
BGM: Você acha que hoje muita gente fala sobre as regras, sem realmente entendê-las? Qual a sua opinião sobre?
Fabio: Eu acho que na grande maioria sim, o meu problema maior não é esse, quando você consegue explicar para o professor ou o atleta o que aconteceu e percebe se que é falta de conhecimento ainda é mais leve, o difícil é tentar explicar a sua decisão baseada na regra para alguém que a conhece e mesmo assim a pessoa ainda debate com o coração e não com a razão.
BGM: Quais as dicas que você dá para quem deseja se tornar um árbitro no futuro?
Fabio: Tentar estagiar o máximo, tirar dúvidas com os mais experientes e ter convicção que o único elogio que vai receber no dia vai ser de um árbitro ou do coordenador. Ficar sempre atento no filme da luta, onde começa e onde termina.
E como não poderia faltar o lado feminino falando sobre, convidamos também a multi campeã Talita Treta para dar uma contribuição:
BGM: Qual foi a maior dificuldade que já enfrentou na profissão?
Talita: Com certeza a responsabilidade. Eu sou atleta, sei o que cada um passa para estar ali no campeonato, falta de dinheiro, treinos duros e etc. Eu não quero prejudicar ninguém, por isso tenho que estar sempre focada e com muita atenção, o que é bem difícil quando chega no final do campeonato e sua mente está cansada. Mas procuro fazer sempre meu melhor!
BGM: Qual foi a luta mais difícil que você fez?
Talita: Acho que não tem uma luta que seja mais difícil, mas eu acho complicado de arbitrar lutas de faixas brancas. Eles são muito ansiosos e não tem medo de nada, então minha atenção tem que redobrar.
BGM: Você acha que hoje muita gente fala sobre as regras, sem realmente entendê-las? Qual a sua opinião sobre?
Talita: Com certeza. Nos campeonatos infelizmente escutamos coisas absurdas de alunos e até professores. Acho que os professores deveriam participar mais dos cursos e passar para seus alunos, incentivá-los a querer conhecer a regra, a participar dos cursos. Isso é muito importante, o professor tem que saber a regra do seu esporte!
BGM: Quais as dicas que você dá para quem deseja se tornar um árbitro no futuro?
Talita: Acho que a primeira coisa é querer. Tenho um lema na minha vida: “faça tudo com amor” . Segundo, fazer os cursos das confederações e federações, mesmo que você não queira ser árbitro naquele momento, mais para ter o conhecimento da regra. Terceiro, procurar um responsável e falar para ele seu desejo, ninguém nasce sabendo, você vai estagiar e vai aprender! Estude, treine, na academia sempre “brincamos de arbitrar” lutas e isso é bem legal. Sempre discutimos regras na academia, tiramos dúvidas e quando não sabemos procuramos os responsáveis e perguntamos. Não tenha medo.
Feito isso, ao final conversei com algumas meninas, para entender um pouco sobre o que elas pensam sobre a função do árbitro, e uma das respostas que mais gostei (e que espero que sirva de exemplo para muita gente) foi da faixa branca Thaina Motta, de QG da Luta (filiada a Orions – Nova União), União-PI:
“Acho que eles devem, primeiramente prezar pela imparcialidade total na pontuação/decisão da luta e manter o respeito entre os atletas (em cofronto/luta no tatame). Devem ser respeitados (antes, durante e depois das lutas arbitradas) e ter auxílio imparcial e eficiente na arbitragem. Penso em fazer curso de regras para conhecer mais sobre as normas de cada organização de campeonatos grandes, e para ficar mais por dentro do esporte para competição.”
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Bom, galera, é isso! Acho que deu pra entender um pouco mais sobre a profissão, deu pra entender que se o árbitro está lá, ele estudou pra isso, se qualificou, e deve ter um pouco mais de experiência do que quem está do lado de fora assistindo. Lembre-se: sem árbitro, não tem luta. Valorize o árbitro!
Para quem quer saber mais sobre as regras, o livro está disponível para download aqui.
Leia também: IBJJF destrincha as principais mudanças nas regras do jiu jitsu.
Boa semana à todos 🙂 Oss