Para quem pensa que a história das mulheres nas artes marciais, mais especificamente no Jiu Jitsu, é recente, talvez nunca tenha ouvido falar nas suffragettes (sufragistas) que, no fim do Século XIX e início do Século XX em Londres, fizeram parte de um verdadeiro exército sem armas. Após várias tentativas pacíficas pela aprovação do voto feminino no país, elas dominaram a arte marcial para literalmente enfrentar a polícia britânica e lutar por este direito sem serem humilhadas ou facilmente dominadas.
Porém, a história das mulheres nas artes marciais em geral vem de muitos séculos antes. Nas sociedades antigas da China e do Japão elas dominavam técnicas de defesa pessoal para várias finalidades, inclusive proteger a família, ou seja, era, acima de qualquer vaidade, uma questão de sobrevivência dos seus clãs. Atualmente as mulheres estão presentes em todas as modalidades de artes marciais espalhadas pelo mundo, assim como também são dissipadoras de conhecimento sobre cada arte por elas dominada.
No Jiu Jitsu temos vários exemplos dessas desbravadoras, algumas como instrutoras dentro ou fora do Brasil, outras como lutadoras de grandes eventos voltados à luta como o MMA, ou, ainda, as que atuam em ambos os lados. Se cada uma delas servir de inspiração para tirar alguém da zona de conforto e correr para um tatame, aí vão algumas dessas guerreiras e um resumo de suas histórias:
Yvone Duarte foi a primeira mulher a receber a faixa preta de Jiu Jitsu no Brasil. A honra foi concedida pelo Mestre Osvaldo Alves em 1990. Esta atleta dedicou 37 anos de sua vida ao Jiu Jitsu e hoje, aos 51 anos, ainda vive para contar essa linda história.
Kyra Gracie foi a primeira mulher faixa preta da família Gracie. E para quem pensa que esta seria uma tarefa simples para alguém pertencente a este clã se enganou. Kyra precisou enfrentar a família para poder treinar, pois quando os Gracie perceberam que a coisa era séria e a relação dela com o Jiu Jitsu seria muito mais do que esperavam, foi convidada a “deixar a luta com os homens”. Mas ela não deixou se abater e continuou treinando, tornando-se referência para todas as mulheres nos tatames do Brasil e do mundo por sua simpatia e técnica refinada. Além de ter sido cinco vezes campeã mundial, com apenas 19 anos foi a atleta mais jovem a vencer o ADCC, repetindo esta façanha por mais três vezes. Atualmente é apresentadora e comentarista nos canais SporTv e Combate, onde faz comentários sobre o maior evento de MMA do mundo, o UFC.
Letícia Ribeiro, atleta veterana da Gracie Humaitá e seis vezes campeã mundial é uma das maiores referências do Jiu Jitsu feminino. Mudou-se para os EUA em 2010 e hoje lidera uma grande equipe. É reconhecida por desenvolver um trabalho técnico de alta performance voltado ao Jiu Jitsu feminino.
Mackenzie Dern é faixa preta da Gracie Humaitá, nascida nos EUA, filha do grande lutador brasileiro conhecido como “Megaton”. Esta atleta é hoje a uma das mais admiradas do mundo, tanto por seu carisma quanto pela sua técnica. Entre os seus principais títulos estão o de seis vezes campeã mundial (desde a faixa azul) e mais recentemente campeã do Abu Dhabi World Pro Champion (categoria e absoluto), disputado em Abu Dhabi. Ela pretende se engendrar pelo mundo do MMA e não esconde que vem treinando pesado para cumprir com esta meta.
Beatriz “Bia” Mesquita, cria da fantástica Letícia Ribeiro, esta atleta da Gracie Humaitá tem sido inspiração para muitas mulheres. Três vezes campeã mundial (desde a azul) e campeã de diversas outras competições, Bia iniciou na modalidade para acompanhar seu irmão e manter uma atividade física. Ela também praticou natação, Judô e a Luta OIímpica.
E para fechar o rol de celebridades, vamos de Gabrielle “Gabi” Garcia, a atleta da Alliance que é um exemplo de superação, foco e determinação em todos os sentidos. Entre seus principais títulos estão os de nove vezes campeã mundial, oito vezes campeã do Abu Dhabi World Champion Pro e campeã do ADCC em 2011. Gabi reside atualmente nos EUA onde treina para os próximos desafios no MMA e teve sua estreia recente na modalidade em um evento denominado Rizin (o “novo Pride”), realizado no Japão, no qual saiu vitoriosa. Embora a vontade de mencionar e relevar as qualidades de todos os grandes nomes do Jiu Jitsu feminino seja enorme, seria também um desafio imensurável porque essas estrelas, felizmente, não param de crescer e aparecer.
Então, além das mencionadas acima, cabe-nos continuar acompanhando e admirando a evolução de outras grandes atletas que já gravaram seus nomes na história do Jiu Jitsu, como Luiza Monteiro, Michelle Nicolini, Andresa Correa, Luanna Alzuguir, Fernanda Mazzelli, Talita Nogueira, Ana Laura Cordeiro, Monique Elias e tantas outras espalhadas pelo Brasil e pelo mundo. Aqui em nosso blog, no quadro Atleta da semana, é possível ver alguns destaques nas faixas azul, roxa, marrom e preta – toda semana temos uma entrevista exclusiva com essas meninas que estão quebrando tudo pelos pódios afora,
É fato que muitas delas beberam na fonte das referências do passado (mesmo que de forma não intencional) e este é um processo irreversível e necessário, pois a construção desse legado começou com aquelas que brigaram por seus direitos, por suas famílias, por sua liberdade, mas independentemente do objetivo, essas mulheres, sem querer ou saber, contribuíram para que muitos conceitos sobre a presença das mulheres nas artes marciais pudessem ser construídos e contados neste e em vários textos históricos, sempre sob o viés da superação e enfatizando a capacidade de cada uma em ser melhor a cada dia simplesmente por fazerem o que gostavam, mesmo que estivessem contra a própria lógica ou os costumes de épocas distintas.
Elas ainda estão por aí, se multiplicando e são do tipo que não param no primeiro obstáculo porque são unidas pelo tatame, pelo Jiu Jitsu e pela certeza de que a superação é uma amiga que treina com cada uma que ama este esporte.
“Tira o salto alto, veste a melhor armadura e vem pra selva. Hoje é dia de luta, mas amanhã será de glória! Mulheres no tatame, porque SIM!”
Oss!
Para saber mais:
As Suffragettes