Guardeira ou passadora? Uma das primeiras preocupações quando começamos no jiu-ji21tsu é encontrar nosso jogo. Começamos na faixa branca tentando nos descobrir, procuramos reforçar esse jogo e, claro, passamos a aprender a nos virar melhor e a “apanhar” menos.
Aí é que está o X da questão. Vamos combinar que ninguém gosta de ficar tomando amasso, certo? Pois é: de tanto perseguir nosso jogo forte, muitas vezes evitamos nos colocar em situações desconfortáveis nos treinos e perdemos a chance de evoluir e nos tornar mais completas.
Conforto e bloqueio
Até a faixa azul, por exemplo, eu sempre me assumi como guardeira e, coincidentemente ou não, em todos os campeonatos que perdi, eu estava jogando por cima. Fomentei uma crença de que toda vez que não estivesse no meu jogo forte, estaria fadada ao fracasso. Criei, eu mesma, sem perceber, um bloqueio não apenas nos campeonatos, mas também no próprio treino. Eu, no meu automático, só procurava a guarda, onde me sentia à vontade.
Nem preciso dizer o quanto isso é tóxico no aprendizado, certo? Levou um tempo para eu entender que tinha que me colocar em risco, que tinha que procurar também um jogo que não era o meu. Foi só aí que virou a chavinha. Comecei a jogar muitas vezes até melhor por cima e desfiz essa crença. Impressionante o salto qualitativo que isso proporciona: não apenas em técnica, mas especialmente na confiança.
Ok, e como eu encaro essa zona de desconforto?
É da natureza humana ter aversão ao risco e buscar sempre nossa zona de equilíbrio. Por isso mesmo estar propositalmente em nossa zona de desconforto exige disciplina e muita dose de autoconhecimento (sempre ele, né?).
Mas basicamente é:
- Observar. Acabou o treino, é bacana tirar um tempinho para recapitular e nos lembrar dos momentos em que passamos sufoco ou tivemos alguma dificuldade. É reconhecer os pontos fracos, listar as dúvidas e o que precisa ser melhorado.
- Definir metas. Beleza, se já sabemos onde o calo aperta, é hora de definir alguns objetivos. Escolher um ponto fraco e se propor a trabalhá-lo todo treino. Houve uma época em que o jogo em pé era praticamente nulo para mim. Coloquei uma meta de tentar entrar pelo menos uma queda em todos os treinos. Escolhi um tipo de queda e passei semanas insistindo em aplicá-la no rola. Nem preciso dizer que passei um bom tempo me estrepando, né? Achei que não ia rolar até que depois comecei a pegar o timing e, quando vi, o movimento passou a fazer parte do meu repertório naturalmente.
- Esquecer o ego. Colocar-se em posições que são ruins para nós exige lidar com questões delicadas como fracasso, sentir-se mal de ser pega várias vezes no treino. O psicológico joga contra, é difícil entender que faz parte do jogo. Mas é preciso construir um diálogo interno de que a situação não é ameaçadora, mas é algo necessário para melhorarmos.
Onde queremos chegar
Meu mestre sempre diz que na faixa branca a gente descobre nosso jogo. Na azul, aprimoramos nosso jogo mais forte. Na roxa, temos nosso forte e vamos um pouco além. Na marrom, teoricamente, tentamos ser mais completas, tanto na guarda como na passagem. E aí vem a preta para lembrar que não é o fim da linha, na verdade, é o começo de um novo aprendizado sobre as nuances e sutilezas do jiu-jitsu como um todo. Trabalhar na zona de desconforto só amplia nossa visão nesta caminhada e a torna ainda mais recompensadora.