Muito se discute acerca do jiu-jitsu ser uma luta, um esporte ou uma arte marcial, e o David Torres já falou muito bem aqui no portal sobre isso. Como ele diz no texto, a arte suave tem características que a colocam nessas três categorias. Porém, sempre escutamos “Jiu-jitsu é mais que um esporte, é um estilo de vida” e não é mentira. Um professor da minha equipe falou isto outro dia e me marcou: nós não vamos para o tatame como em qualquer outro esporte ou aquele hobby semanal em que você faz amigos, se diverte. Hoje, muitos começam no jiu-jitsu só para perder uns quilinhos e ter aquele escape da rotina, mas é muito mais que isso. Quem capta a essência do jiu-jitsu acaba encontrando muito mais, encontra os valores de uma arte marcial, a disciplina (pessoal e com os mais graduados), o respeito e, também, a paciência e a persistência.
Esses dois últimos são muito importantes, pois se você espera resultados rápidos no jiu-jitsu, pode esquecer, melhor praticar outro esporte. Muita gente leva oito, até dez anos para pegar a faixa preta. Mesmo os que se destacam ou competem e ganham tudo, alcançam essa graduação com, no mínimo, aproximadamente cinco anos (de acordo com o tempo mínimo de permanência em cada faixa determinado pela IBJJF). É preciso ter paciência, se dedicar muito e ser persistente para não desistir no meio do caminho, o que acontece com muitas pessoas. E sabe qual faixa tem o maior índice de desistência? A azul.
Sabemos que não há unanimidade nas graduações do jiu-jitsu, tem gente que fica dois anos, outros mais de três na azul. Mas quando você chega na azul, é amassado na academia, porque agora não dá mais para aliviar, então os mais graduados te exigem mais e os menos graduados querem te dar trabalho. Sem falar na responsabilidade na equipe, que a cada graduação vai aumentando e você precisa ser um bom exemplo. Nos campeonatos é a mesma história, você pode pegar meninas que passaram por faixas como a laranja, verde ou, mesmo se não passaram, já estão há muito mais tempo na azul e são bem mais cascudas que você. Aliás, quanto aos campeonatos, eu, particularmente, já não fico mais tão nervosa quanto na branca. Agora a fase é de querer lutar bem, não ser finalizada, dar algum resultado para a minha equipe.
Agora, em dezembro de 2016, faço um ano na faixa azul e foi exatamente isso que aconteceu. No primeiro ano, a gente só apanha, pensa em desistir, se desestimula. Mas, conversando com meu tio (que já fez jiu-jitsu), ele me contou uma história que havia lido, a do bambu chinês. Quando é plantado, ele fica sem crescer por cinco anos, exceto pelas raízes. Depois de muito crescimento subterrâneo, ele começa a brotar e pode atingir 25 metros. Ninguém vê que a planta está gerando raízes, criando bases para seu desenvolvimento. O início da faixa azul é assim, parece que você não sai do lugar, que não tem avanço. Mas é ali que você cria suas raízes, descobre um jogo confortável, aprimora as posições básicas que já aprendeu. Se alguém achar que o bambu não está crescendo e cortá-lo, nunca vai saber todo o potencial de desenvolvimento que ele tinha. Se você desistir no meio do caminho, nunca vai poder cumprir suas metas e objetivos e buscar desafios maiores.
Meu primeiro ano de azul não foi nada produtivo se eu for falar em resultados práticos. Não ganhei nenhum campeonato, nenhuma luta. Mas é justamente nesses momentos, de derrota, que criamos as nossas raízes, como bem lembrou o meu tio também. Quando entrevistei a Julia Boscher para o Atleta da Semana, ela falou sobre isso. Na faixa azul, estava sempre ganhando e encarou uma fase ruim quando subiu para a roxa. Ela disse que se tivesse perdido na azul, talvez chegasse na roxa com alguns erros já corrigidos. Tenho um companheiro de treino que se destaca nos campeonatos, hoje na faixa roxa. É um dos principais competidores da equipe. Em um dos campeonatos que eu perdi, eu desabei, fiquei muito mal e ele me lembrou que no primeiro ano de faixa azul não ganhou nenhuma competição, mas depois conquistou vários títulos e pódios. Então, por mais que uma derrota te deixe para baixo, pense nela como mais um degrau, como um aprendizado e, principalmente, se valorize por ter lutado, pois muita gente não consegue ou não quer competir.
A arte suave nos exige muita paciência, mas não no sentido de sentar e esperar que o sucesso venha, pois isso nunca vai acontecer. É preciso ser persistente, treinar, botar a cara nos campeonatos, buscar desafios e metas para o seu desenvolvimento. O início da faixa azul é o momento de lapidar seu jiu-jitsu. Corrigir os erros que passavam batido na branca, descobrir qual jogo encaixa melhor, aprimorar suas melhores posições e finalizações. E, acredite, se lapidar não é nada fácil, não é de um dia para o outro. Portanto, se você não quer encarar o jiu-jitsu como seu hobby de uma vez por semana, mas sim como uma arte marcial e um esporte no qual você quer competir, não desista. É na azul que a maioria desiste. Essa é a hora que você precisa ser mais dedicado, precisa buscar forças e estímulo de onde você acha que já não tem mais. Converse com os mais graduados, com seu mestre, eles também já passaram por isso. Suas raízes serão muito sólidas se você seguir por esse caminho. O jiu-jitsu ainda tem muito a te proporcionar, com certeza, então faça da sua faixa azul um desafio, um aprendizado, um obstáculo a ser superado e valorize muito cada conquista na nossa querida azulzinha, pois não é todo mundo que passa dela.