Jiu-jitsu e o público LGBTQIAPN+. Por que é tão difícil ver gays no tatame?

LGBTQIAPN+

Jiu-jitsu e a comunidade LGBTQIAPN+: O jiu-jitsu é uma arte marcial que tem crescido cada vez mais em popularidade pela sua eficácia. Respeitada mundialmente, a ‘arte suave’, como é conhecida, foi aperfeiçoada no Brasil pela família Gracie e um de seus maiores atrativos era a possibilidade que a arte marcial dava às pessoas mais frágeis de derrotar grandes adversários. 

Contudo, para a comunidade LGBTQIAPN+, um dos públicos mais necessitados desse conhecimento, o caminho até os tatames tem sido repleto de obstáculos, preconceitos e exclusão. 

Eu quero começar esse artigo com uma pergunta simples, porém, com uma profundidade absurda visto que, entre cada 100 pessoas que treinam, nem 5 conhecem algum praticante gay.

Quantos gays você conhece que treinam? 

Porém, quando se fala sobre mulheres bissexuais e lésbicas, a coisa é um pouco diferente. 

Historicamente, artes marciais, incluindo o jiu-jitsu, têm sido dominadas por uma cultura majoritariamente masculina e muito machista. Isso cria um ambiente hostil e excludente para indivíduos LGBTQIAPN+. Alguns dos principais desafios enfrentados incluem:

  • Receptividade ruim: Muitas academias de jiu-jitsu cultivam um ambiente machista, onde comportamentos e atitudes sexistas são comuns. Piadas homofóbicas, linguagem ofensiva e a falta de respeito pela diversidade são exemplos de como o machismo se manifesta nesses espaços. Esse ambiente tóxico pode fazer com que pessoas LGBTQIAPN+ se sintam desconfortáveis, inseguras e não bem-vindas.
  • Discriminação: A discriminação direta é uma realidade para muitos praticantes LGBTQIAPN+. Além de casos de rejeição aberta, os olhares de desdém ou até mesmo agressões verbais e físicas são mais comuns do que imaginamos. 
  • Falta de Representatividade: A ausência de representatividade LGBTQIAPN+ dentro das academias de jiu-jitsu também é um fator que contribui para a exclusão. Sem exemplos visíveis de atletas LGBTQIAPN+, muitos podem sentir que não há espaço para eles nesse esporte.

Mas por que praticantes lésbicas são mais aceitas? Pelo nosso tão conhecido machismo. 

O jiu-jitsu como uma arte marcial majoritariamente masculina, segue perpetuando a ideia de que “mulher com mulher é legal”, afinal, a visão de mulheres que sentem atração por outras soa até atrativa para a grande maioria do público masculino. O que não acontece em relação às outras vertentes incluídas na comunidade LGBTQIAPN+.

Homens, no geral, acreditam que um esporte de luta agarrada não pode ser praticado por homens que sintam atração por outros homens. E então, chegamos na profunda questão da masculinidade frágil que entra em xeque nesse tipo de dinâmica. 

Será que o medo de acabar gostando do toque do colega é tão grande assim? Eis a pergunta de milhões.

A Necessidade da Prática de Artes Marciais para o Público LGBTQIAPN+

O grande pesar nessa situação toda é que, a prática do jiu-jitsu pode ser extremamente benéfica para pessoas LGBTQIAPN+. Além de sermos o país que mais mata pessoas desse público, também somos compostos de uma população que é conservadora só quando convém.

Por isso é tão importante que levantemos essa bandeira em favor desse público tão descriminalizado e vulnerável.

Pessoas que se identificam como LGBTQIAPN+ frequentemente enfrentam situações de violência e agressão física por sua orientação sexual ou identidade de gênero. 

  • Somente no ano passado, 257 pessoas LGBTQIAPN+ foram vítimas de mortes violentas no Brasil, conforme divulgado pelo Grupo Gay da Bahia (GGB), a mais antiga organização não governamental LGBT da América Latina. O país manteve sua triste classificação como o mais homotransfóbico com uma pessoa LGBTQIAPN+ perdendo a vida de forma violenta a cada 34 horas.

O mais alarmante é que esse número pode ser ainda maior, visto que, muitas vezes é omitida a orientação sexual ou identidade de muitas vítimas. 

  • Entre as mortes registradas, 127 foram de pessoas travestis e transgêneros, 118 gays, nove lésbicas e três bissexuais e 67% das vítimas eram jovens entre 19 e 45 anos.
  • O estudo também destacou que 40% perderam a vida nas ruas ou espaços externos. O padrão persistente inclui travestis sendo assassinadas a tiros em pistas, terrenos baldios, estradas, motéis e pousadas, enquanto gays e lésbicas são mortos a facadas ou com ferramentas domésticas, principalmente dentro de seus apartamentos. 
  • 59% das mortes foram na na Região Sudeste, seguida da Região Nordeste, que ficou em segundo lugar no estudo. 

Diante desses números alarmantes, o jiu-jitsu, com seu foco em técnicas de defesa pessoal, oferece ferramentas indispensáveis para auxiliar as pessoas a protegerem sua integridade física. Saber como se defender pode salvar vidas e proporcionar uma sensação de segurança ao transitar no dia a dia.

A prática regular do jiu-jitsu ajuda a construir confiança e autoestima. Para pessoas LGBTQIAPN+, que todos os dias lidam com discriminação e estigmatização, essa confiança pode realmente fazer a diferença.

Atualmente já existem espaços que estão comprometidos com a criação de um ambiente seguro e acolhedor para todos, embora ainda sejam raros de encontrar.

A pergunta que não quer calar: Como é possível mudar esse cenário?

Primeiro é preciso querer. Os líderes de academias devem investir em programas de educação e sensibilização para combater o machismo e a homofobia. Treinamentos sobre diversidade e inclusão podem ajudar a criar um ambiente mais decente e seguro para todos.

Instituir políticas de tolerância zero contra discriminação e assédio também é tão fundamental que nem precisaria ser mencionado. Mas é aquilo, o óbvio também precisa ser dito.

Precisam haver consequências para comportamentos inadequados. A aplicação rigorosa dessas políticas demonstra um compromisso real com a inclusão. Já passar pano pro coleguinha dizendo que “foi só uma piadinha” só reforça algo que nem deveria existir.

O público LGBTQIAPN+ quer respeito e acolhimento. Logo, é papel dos líderes criar espaços seguros dentro das academias onde essas pessoas possam treinar sem medo de discriminação. 

A relação entre o público LGBTQIAPN+ e o jiu-jitsu é complexa e desafiadora, marcada por preconceitos e exclusão em muitas academias. Porém, é importante que nós como sociedade percebamos que é nosso dever como disseminadores de uma arte marcial tão bonita, incluir a todos os públicos.

Para que o jiu-jitsu se torne verdadeiramente inclusivo, é necessário um esforço de toda uma comunidade. Somente assim poderemos garantir que todas as pessoas, independentemente de sua identidade, possam desfrutar dos benefícios dessa arte marcial transformadora.

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