Faixa marrom, a atleta fala sobre representatividade negra, racismo e sua trajetória no jiu-jitsu
Hoje vamos conhecer a história da Thayna de Paula, que é faixa marrom de jiu-jitsu e mora em Cidade Ocidental, Goiás. Ela treina desde os 17 anos e conheceu o jiu-jitsu através do marido, que era faixa marrom na época.
Antes de engravidar da pequena Maria Valentina, ela treinava todos os dias. E quando sua filha completou 7 meses, ela voltou aos tatames e continuou treinando duro. “Treinei mais pesado ainda, porque sempre fui muito competitiva e queria lutar o mundial. Meu sonho ainda! Então sempre treinei muito, mas dessa vez conciliando com o trabalho.”
Agora, com a pandemia, ela não conseguiu treinar no começo mas depois arrumou um tatame e treina em casa com o marido, que é professor. Antes, gostava mais de jogar passando e finalizar no armlock, mas hoje também trabalha mais a guarda e gosta de finalizar no leg lock.
Desafios
A maioria das atletas relatam ter essa dificuldade e com Thayna não é diferente. “A falta de reconhecimento. Sempre fui muito esforçada e topava todo tipo de desafio. Mesmo treinando e procurando mil maneiras de lutar os campeonatos mais expressivos não conseguia patrocínios e apoiadores para ter um currículo esportivo mais expressivo.”
Além disso, Thayna ressalta uma questão muito importante e pouco falada: o racismo. Ela deu o exemplo do atleta Angelo Assumpção, que se posicionou em relação ao racismo que sofreu de outros atletas e foi demitido do clube em que estava. E conta: “Já perdi oportunidade de um patrocínio para uma colega de treino (pele branca), menos graduada e sem muitas experiências e expressão em campeonatos, porém mais conhecida nas mídias sociais. O patrocinador alegou que o meu perfil não vende, mesmo inicialmente o primeiro contato comigo ter vindo por ver os campeonatos que lutei, e se interessar a partir daí, porém desistiu.”
Thayna comenta que mesmo com muitas pessoas fazendo “piada” ou tentando apagar o fato de existir racismo, não podemos negar que vivemos em uma sociedade racista e precisamos falar sobre isso. É assunto sério e existe em todas as esferas da sociedade. E o jiu-jitsu não está imune. “Ser uma menina negra no jiu-jitsu se torna mais difícil, porque somos apagadas, desvalorizadas por não ser o padrão. E falar disso para muitas é complicado. Porque quando falamos somos silenciadas, taxadas de vitimistas.”
A atleta ainda lembra da questão da representatividade. “Se formos olhar algumas páginas de jiu-jitsu feminino de repost você não vê meninas negras e isso pode influenciar muito no padrão estético escolhido por patrocinadores (academias, suplementos, kimonos, etc…). Logo você enfrenta uma falta grande de representatividade e apoio pra seguir nesse esporte tão caro.”
Recentemente, abrimos uma caixinha de perguntas no instagram do Bjj Girls Mag falando justamente sobre isso e muitas meninas comentaram que sentem falta de mais mulheres negras aparecendo em perfis de jiu-jitsu, tendo suas histórias contadas. Isso é fundamental para termos mais representatividade.
Benefícios do jiu-jitsu e inspirações na caminhada
A arte suave trouxe muitos benefícios para a vida de Tahyna, como ela mesma conta: “Me deu mais responsabilidade, equilíbrio emocional e uma forma de aliviar os problemas do dia a dia. Ser competidora te motiva a fazer a diferença, querer algo a mais, te fortalece, não só fisicamente, mas mentalmente. Libera energia e liberta.”
As maiores inspirações dela estão bem pertinho: mãe, filha e marido. “Eu tenho muito apoio deles, principalmente do meu marido que me apresentou o jiu-jitsu e deixou de lutar muitos campeonatos pra eu seguir meus sonhos. Ele foi meu maior incentivador.” Além deles, atletas que ela também tem como referência: “Gabi Pessanha, tão nova e tão esforçada, muito humilde, talentosa. Nina Moura, que por um tempo acompanhei nos campeonatos mais próximos (Brasília) e é extremamente talentosa com um jiu-jitsu sinistro. E uma das primeiras referências foi a Michelle Nicolini, o jiu-jitsu dela sempre me impressionou.”
Para finalizar, Thayna deixa um recado para as meninas negras e todas as meninas do jiu-jitsu:
“Se dedique sempre, siga suas intuições, valorize pessoas que te apoiam desde o início. Seja forte, se valorize, questione os padrões. E nunca desista. Podemos conquistar o mundo e fortalecer umas às outras. Uma pela outra.”
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