Tudo no seu tempo: da faixa ao professor

O jiu-jitsu é uma modalidade de arte marcial que vem ganhando adeptos por todo o mundo, rompendo as fronteiras do preconceito e ganhando respeito não somente como um esporte que promove a melhoria da qualidade de vida dos seus praticantes, mas também por possuir um potencial de mercado capaz de movimentar desde campanhas pesadas na mídia especializada até o comércio de roupas específicas, lojas de suplementos e oportunidades de trabalho em várias partes do mundo.

Mas, que tipo de “profissional” enxergou o oportunismo neste mercado? Neste artigo vamos tratar das questões que permeiam os interesses escondidos por trás do comércio mais do que conhecido de faixas dentro do jiu-jitsu, daqueles que, de uma hora pra outra, aparecem com graduação nova, sem procedência, abrindo academias e se autodenominando professores, como se aprender e ensinar a Arte Suave fosse um truque de mágica e não um processo continuado de dedicação, sangue e suor.

Não é de hoje que se ouve dizer que a faixa de Jiu-jitsu virou sinônimo de cobiça e ganância, um artigo de luxo que passou a ter valor, formas e data, nem sempre lógicas, para ser adquirida. Observemos que aqui cabe um diálogo infinito sobre todas as faixas, pois de um tempo pra cá todas elas passaram a ter um preço, mas, em especial prender-me-ei à faixa preta, uma vez que a mesma se diferencia das demais por se tratar daquela em que o ganhador passa a ser o mestre, o professor, o já qualificado para transmitir o conhecimento.

Mas, há uma discrepância nisso tudo, pois as histórias de pessoas que “ganham” a faixa preta de forma duvidosa não são incomuns neste meio, tampouco dos que a adquirem com segundas intenções, como abrir uma academia e ministrar aulas mesmo sem terem qualificação para tal. Situações assim injetam um misto de desânimo e decepção por parte dos que estão há muito tempo no caminho do Jiu-jitsu correto, o caminho do aprendizado constante.

A verdade é que com a expansão do jiu-jitsu pelo mundo e a necessidade de mais professores, a “conquista” de uma graduação passou a ter papel secundário para dar vez ao “ganho” de faixa, pois esta adquiriu uma estranha urgência que corrobora firmemente com interesses pessoais (status) e financeiros que nada condizem com a filosofia da maioria das artes marciais (e a Arte Suave não está isenta disto).

Impossível não perceber que algo se perdeu pelo caminho, perda esta que traz em si a grande necessidade de mudanças na modalidade, e não somente no que concerne às regulamentações, pois estas já são dispostas pelas confederações, cada uma ao seu modo, mas, sobretudo na urgente tomada de consciência de alguns praticantes que precisam parar de atropelar o processo de aprendizagem, obedecer às regras de graduação e entenderem que o Jiu-jitsu é um esporte que precisa do exercício do bom senso para não correr o risco de cair na banalidade, algo que não está muito distante de nós se continuarmos neste ritmo.

Um exercício imprescindível deve começar pela observância da qualificação do professor e, se pela falta de informação, um pretendente à prática do Jiu-jitsu se matricular numa academia em que tudo pesa contra aquele que vai lhe ensinar, este aluno estará fadado ao fracasso ou decepção. Atente para o fato de que muitos alunos trocam de academia, mesmo sabendo que, ao entrar numa, é como se entrasse numa família.

Estes que saem são taxados de “creontes”, mas ninguém atenta para a possibilidade de haver problemas com o professor, na sua didática (ou na falta dela), na sua faixa duvidosa (que muitas vezes é encoberta), nas situações que estão distantes dos olhos de quem não vive o dia a dia daquela equipe. Pois bem, o problema de se pegar faixa antes do tempo ou de adquiri-la de forma duvidosa perpassa por tudo isso e muito mais.

Se você pensou que quem pega a faixa preta está apto a ser professor, enganou-se. Em condições ideais só poderia ministrar aulas aquele que estivesse em dia com o curso de regras e arbitragem (onde é possível aprender, entre outras coisas, quais os golpes proibidos e permitidos dentro de cada graduação); que conhecesse minimamente sobre didática do ensino desportivo (tudo precisa ser sistematizado e as aulas não devem ser aleatórias); e ter o curso de primeiros socorros e anatomia básica (afinal, acidentes acontecem e saber o que fazer nos momentos críticos é fundamental).

Além disso, é possível construir um professor de Jiu-jitsu ao longo da sua trajetória dentro da academia e das competições, pois aquele que nunca ensinou sequer um golpe aos iniciantes, ao pegar a faixa que lhe permite ensinar de forma independente jamais o fará com a mesma habilidade se tivesse começado desde a faixa roxa, por exemplo, como auxiliar supervisionado pelo professor. A lógica é que para cada faixa o aluno apresente um rol de conhecimentos e habilidades compatíveis com a graduação almejada e saiba transmitir isso sem ensaios, sem experimentos, pois os alunos não são cobaias. Ou o professor está preparado para ensinar ou não!

E se ele não está preparado, se ele comprou a faixa de outro pior que ele, se ele a pegou faixa antes do tempo, se ele não tem escrúpulos e se auto-graduou para obter vantagens, então estaremos diante de situações que nos provam fatidicamente o que se perdeu neste caminho de expansão do Jiu-jitsu, e foi nada menos do que a capacidade de se aplicar a meritocracia na conquista de uma faixa, aliada à falta de conhecimento das regras hoje estabelecidas pelas confederações. Nestas circunstâncias o tal professor mal intencionado irá replicar o seu mau-caratismo e em breve ele terá uma legião de maus caracteres à disposição do Jiu-jitsu. E o Jiu-jitsu vai perdendo a credibilidade que demorou tantos anos para adquirir.

Para os que ganham, compram ou se dão a faixa para usá-la da pior forma possível, como abrir uma academia e ensinar qualquer coisa aos alunos e ainda cobrar caro por isso, o bom senso ficou a dever começando por quem graduou este “professor”, que nada mais é do que a base da cadeia irregular. Aqui cabe a relevância do levantamento, por parte do aluno iniciante, do histórico do professor, uma atividade simples de busca de informações sobre as suas raízes, quem o graduou, quanto tempo ensina e até os seus títulos, quando for competidor.

O aluno precisa ser conhecedor daquele que vai ensinar–lhe o Jiu-jitsu para toda a vida e fazer as escolhas pautadas no que se tem de concreto e não de suposto, muito menos por facilidades do tipo “porque a academia é mais próxima ou mais bonita” e menos ainda “porque o preço é bom”. Atitude como esta (embora não seja a única), tornaria possível dar início ao banimento dos oportunistas do Jiu-jitsu e dificultaria que eles se perpetuem e se espalhem como cânceres em plena metástase que só servem para corroer a imagem do esporte.

O jiu-jitsu merece respeito por ser este esporte capaz de mudar vidas, despertar o que há de melhor naqueles que o praticam em sua plenitude e dentro das suas regras, além disso, tem a capacidade de atingir um mercado muito maior do que o já conquistado. Porém, todos os praticantes, admiradores e amantes do esporte devem se unir contra as aberrações que temos hoje em algumas academias e que vem transformando o jiu-jitsu num livre comércio de faixas e jogando no mercado professores oportunistas e mal qualificados.

A realidade do jiu-jitsu hoje permite que muitos praticantes vivam do esporte, seja no Brasil ou em várias partes do mundo, mas, se quisermos caminhar para a excelência no ensino do jiu-jitsu precisaremos banir os maus exemplos o mais rápido possível. Esta mudança deve começar pelos eternos alunos da Arte Suave que não têm pressa nem urgências descabidas ou interesses escusos, pois esses reais praticantes sabem que tudo tem o seu tempo, que o caminho é longo e sem atalhos, mas é o caminho correto.

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