Jiu-Jitsu contra a cultura do estupro

Hoje resolvi abordar um tema delicado, mas de suma importância. Iremos conversar sobre a cultura do estupro. Primeiramente, precisamos de definir os termos: o estupro ocorre sempre que há um ato sexual na qual uma das partes envolvidas não consente com a atitude da outra. E isto não significa, necessariamente, que ocorra penetração. Qualquer ato sexual sem consentimento é, sim, estupro. Isto esclarecido, temos que entender como o jiu-jitsu, a tão maravilhosa arte suave, pode ser usada contra esta cultura predominantemente machista.

Um caso mais extremo ocorre quando a vítima é submetida com força bruta e violência pela parte agressora. E, neste caso, o jiu-jitsu como uma arte marcial de autodefesa, é uma ferramenta sem igual que pode permitir que a mulher reaja fisicamente contra o seu agressor. Chaves de braço e estrangulamentos são ótimas opções para estas situações desagradáveis.

Não são raros tutoriais e cursos específicos mostrando como uma mulher pode reagir frente a esta situação tão traumática e constrangedora. Mas lembre-se que para uma reação eficaz é necessário conhecimento e prática e, por isto, estar em constante treinamento é fundamental. Por mais absurdo que pareça a afirmação, o jiu-jitsu hoje é quase “obrigatório” para as mulheres, não como esporte e busca por uma vida mais saudável, mas como segurança mesmo. Uma triste realidade, mas cada vez mais presente em nossa sociedade.

Antes de fechar esta coluna, pude contar com o depoimento de uma mulher praticante de jiu jitsu, que obviamente prefere se manter em sigilo por razões óbvias e relatou ter sofrido, em sua primeira academia, um assédio sexual dentro do tatame por parte do professor. E foi uma assédio violento no qual os detalhes não importam aqui. Com certeza o caso dela não foi o primeiro e, infelizmente, não será o último. Banimento do esporte é uma pena ainda branda para este tipo de “profissional”.

Para piorar a história, a nossa colega fez um boletim de ocorrência que, infelizmente, não resultou em nada e ainda fez com que ela fosse ameaçada por um outro aluno deste professor. Felizmente, a vítima teve forças para levar a sua história para frente. E, através de um contato em uma confederação importante, conseguiu que o referido professor fosse expulso da academia. Esta história, por mais feia que seja, ainda teve alguma justiça. Mas, infelizmente, a maioria não tem. É necessário dizer que o contato da vítima na confederação era também uma mulher. Será que um contato masculino teria ajudado? Talvez…

Que o jiu-jitsu pode ajudar fisicamente não existem dúvidas, mas é justamente o outro aspecto que gostaria de focar hoje aqui. Jiu-jitsu não é, como sempre enfatizamos, apenas autodefesa e técnicas num tatame. Deve ir além, deve transcender os limites do tatame e ser utilizado na vida. O que quero dizer com isto é que precisamos URGENTEMENTE reeducar nossa sociedade. Em especial os valores que são transmitidos e ensinados aos homens.

Ainda que seja comum algumas sugestões contra estas atitudes e, considerando o alcance que a BJJ Girls Mag tem, vou me permitir expor três delas aqui:

  1.  Não compactue com o lado opressor: se você sabe de alguma história e não está apoiando a vítima, saiba que você está ao lado do opressor, ainda que não esteja percebendo isto;
  2.  Não relativize o testemunho da vítima: querer diminuir o relato da vítima é a prática conhecida como gaslighting. É um termo cunhado entre os anos 30-40 para expressar o abuso psicológico sobre a vítima. As informações por ela relatada são distorcidas, intencionalmente omitidas ou minimizadas para favorecer o lado opressor;
  3. Tenha uma atitude de apoio prática e não apenas moral: apoiar a vítima não é apenas consolar. É necessário ação e tomadas de providências. Sem uma atitude prática como a denúncia (e.g. Delegacia da Mulher) o apoio é apenas paliativo.

Infelizmente (uma palavra que tanto usei nesta coluna), histórias como essa e situações similares acontecem diariamente. Mas saibam, caras e caros leitoras que, FELIZMENTE, a maioria das academias de jiu-jitsu são sérias. Com pessoas decentes, honestas, trabalhadoras e que querem muito ajudar a tornar o mundo um lugar melhor. Então tenham bom ânimo e procurem um lugar onde a família é sempre bem-vinda.

Meu espaço é curto e não posso, por isso, aprofundar alguns temas neste momento. Mas estou pensando em uma série de textos com pontos específicos nas quais poderemos, sim, conversar mais sobre questões como essa. E, como não poderia ser diferente, termino esta coluna dedicando-a à mulher que mencionei, uma mulher de fibra, guerreira e com um testemunho de superação e coragem inspiradores. A ti, dedico também esta pequena poesia de minha autoria.

Mulher de Valor (By Brenno Neto)

Medos e pavores tomam minha mente
Um vendaval de lembranças
Livre sou para escolher
Hoje, amanhã e sempre
Estarei no caminho do bem e da superação
Resistindo a todo mal…

Deste meu testemunho
Espero apenas a justiça, ainda que divina…

Vida que segue com esperança
Ao se vislumbrar um amanhecer melhor
Livres do machismo e da violência
Onde a igualdade e a justiça imperam
Respeitando-se as individualidades…

P.s: Ainda sobre este assunto, confira outros textos de nossos colunistas a respeito d’A importância da autodefesa femininaRelações de dominação e cultura do estupro.

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