Overtraining: um inimigo do rendimento

Que o jiu-jitsu é um esporte apaixonante ninguém pode duvidar. Que quando se quer treina-se todo dia, de domingo a domingo, ainda mais se tiver uma competição chegando. Também é fato que o jiu-jitsu leva cada centímetro do nosso corpo à exaustão, que os treinos continuados provocam lesões, fadiga muscular, cansaço físico e até mental. Para agravar, existe uma cultura entre os praticantes que diz que “a gente cura as lesões treinando” e “é treinando que se chega à perfeição”, o que significa que nada pode fazer um viciado em jiu-jitsu parar, porque ele torce pro mundo acabar em tatame pra ele morrer rolando (risos).

Mas, e quando o atleta está às portas de uma competição e treina sem critérios até na véspera porque não consegue ficar parado e isso prejudica o desempenho dele na competição? Neste texto, eu trato dessa questão que passa despercebida por grande parte dos atletas de competição, a importância do descanso, sobretudo o de pré-competição.

Antes dessa abordagem, vamos entender o que a sobrecarga de atividade física pode fazer com o nosso corpo. Digamos que um atleta está num embalo alucinante de treinos para uma competição, às vezes mais de um por dia entre treino físico e técnico. Tomadas as devidas proporções hipotéticas, ele começa a perceber que o seu rendimento vem baixando, que ele cansa rápido nos rolas, que se lesiona de forma recorrente e sente dor muscular da qual demora a se recuperar, enfim, ele nota uma queda brusca na capacidade de atender a todo o circuito que a prática do jiu-jitu exige. Ele pensa num monte de possibilidades para estes acontecimentos, mas provavelmente nenhuma relacionada à alimentação e ao overtraining.

Vamos por partes. É sabido que a alimentação correta é fator primordial na vida de qualquer ser humano, mais ainda de um atleta. Então, entende-se que se uma pessoa se coloca no extremo físico diariamente ela deve ter em mente que a sua alimentação deve estar de acordo com essa intensidade. Se este mesmo atleta não consegue manter uma alimentação condizente com a sua atividade e ainda assim exagera na atividade física, além de estar colocando em xeque o seu sistema imunológico e não obtendo nenhum resultado físico positivo, ele ainda corre o risco de ter um overtraining, um problema que ocorre quando o atleta excede nos exercícios e não dá o tempo necessário para que seu corpo se recupere.

Mas o que tudo isso tem a ver com o treino às vésperas de uma competição?

Acredita-se que a gênese da síndrome de overtraining esteja diretamente relacionada com uma estratégia de treino denominada “teoria da supercompensação“, que se fundamenta no princípio da sobrecarga progressiva. Essa teoria afirma que as reservas energéticas gastas durante o processo de contração muscular são repostas apenas no período de recuperação, ou seja, de descanso (Site Eu Atleta – G1, 2016).

Nesta abordagem, embora o termo “descanso” se refira mais ao intervalo entre séries, sobretudo na musculação, vamos tentar trazer esta realidade para dentro do tatame, uma vez que há pouquíssimo material científico sobre este tema dentro do jiu-jitsu e por esta razão boa parte das informações a seguir advêm de experiências adquiridas por mim, enquanto atleta e pesquisadora do assunto, e pela convivência com outros atletas que muito me ensinaram.

Assim, infere-se que o atleta jamais deve extrapolar os limites físicos que a natureza lhe impõe para os treinos diários, afinal, tudo em excesso é prejudicial. Para as vésperas de uma competição, que representa um momento de grande estresse físico e mental que vai repercutir fortemente no desempenho dele na hora da luta, o correto é que o ritmo de treino (físico e técnico) se mantenha pesado até a penúltima semana da competição e que o mesmo tenha começado, no mínimo, dois meses antes do evento (dependendo do porte e da importância do evento). Na semana do campeonato, a atitude mais prudente é relaxar ou, no máximo, fazer treinos leves para evitar lesões, cessando com o treino, no mínimo, dois dias antes da competição.

No intervalo entre o cessamento dos treinos e o campeonato, o atleta deve consumir alimentos que promovam a compensação física em toda a sua amplitude. Além disso, os alimentos devem ser criteriosamente escolhidos para que o atleta não exceda o peso da categoria, quando for o caso. E, por falar em peso, é imprescindível que haja o cuidado de manter a dieta de acordo com o ritmo de treino também para os casos de necessidade de perda de peso para “caber” na categoria a qual se vai competir, pois perdas de peso nas vésperas da competição também não são aconselháveis quando se quer alcançar o alto rendimento.

Na verdade, de nada adianta treinar, treinar e treinar desenfreadamente e se dar mal na luta por conta dos exageros nem sempre percebidos pelos praticantes. Muito dessa “culpa” pode ser creditada à falta de planejamento nas rotinas diárias de treino e à ausência do tão necessário descanso pós-treino e pré-competição. A ausência desses fatores pode levar o atleta a não suportar o ritmo das lutas e a ver todo o seu esforço se dissipando. Começa com aquela falha na pegada, fraqueza nas pernas e braços, o gás que parece sumir dos pulmões e demora a ser retomado, os músculos ardendo. “Caramba, mas eu treinei tanto!”, pensa ele.

O mais difícil nesse contexto todo é admitir que “menos é mais” para quase tudo na vida, ainda mais quando se trata de algo tão bom, prazeroso e viciante como o jiu-jitsu, porém, tudo que nos cerca tem as suas regras, mesmo que nem todos nós as percebamos. Elas estão por aí para nos mostrar que somos movidos por desafios, mas que é necessário sabermos os melhores caminhos para superá-los. Quando se quer ser competidor de verdade é imprescindível saber quem somos, como funciona o nosso corpo, comer o que nos edifica e ter sempre em mente que descansar é parte imprescindível do longo e rigoroso processo de evolução física e mental de todo atleta e saber usar tudo isso em seu favor é tão importante quanto treinar.

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